domingo, 6 de julho de 2008

"A terra dos sonhos"


A trompete de Bagdad

....................................Ao Ehren Watada

A tua crença estava só na morte e tocava. E

continuava sonhando e tocando. E a garganta

era inútil como a garra de um leopardo murado

na cidade sagrada onde se perdiam as sombras.

.

A morte não conseguirá abraçá-la. Como a pele

de um tigre de Bagdad perfumando as lágrimas

cheio de crias recentes. Eu era um corpo diáfano

incluído no exílio sempre aniquilado dos proscritos.

.

E a tua crença de trompetista puxou pelas mãos

a morte de Chang a morte como todos os mortos

que se esquecem. Como se a povoassem opulentos

olhos de animais que te aguardam em Central Park.

.

Há um oásis tumular dentro da terra. Um cadáver

insepulto sob uma salva divina de crenças e gélidas

promessas. Ouve-se apenas o gemido dos mortos

perfeitamente mortos em Bagdad sobre o orvalho.

.

Restam ainda os cânticos doídos do trompetista nu

iluminado agora por fulminantes súplicas putrefactas.

João Rasteiro

New York New York - Frank sinatra

5 comentários:

Maria João disse...

Só a barbárie pode ficar indiferente perante este Poema e o desespero destas mãos... Os polvos têm sempre a "consciência tranquila". Sim, os donos do mundo NUNCA ouvem "o gemido dos mortos/perfeitamente mortos em Bagdad sobre o orvalho".

Um abraço
Maria João Oliveira

jorge vicente disse...

e os nossos cânticos que aniquilam (ou tentam aniquilar) a barbárie estão aqui, neste poema, neste magnífico poema

um abraço
jorge

Gabriela Rocha Martins disse...

o vómito da barbárie no seu mais elevado expoente


dói quando os tentáculos se estendem

putrefactos

[ainda haverá luz ao fundo deste túnel?]


.
um beijo

João Rasteiro disse...

Amigos,infelizmente, a barbárie do forte sobre o fraco(por vezes este é o poderoso, só que ainda não o descobriu)é o lema deste mundo actual, em que o negócio da guerra só não é o mais nojento que conhecemos, em virtude do facto de hoje morrerem mais seres humanos por excessos (e logo má alimentação também)no comer, do que aqueles que morrem por não ter um grão de arroz para enganar o estômago.
Beijinhos e abraços,
joão rasteiro

Anónimo disse...

A visão estòmacal...uma pena, uma pena