sábado, 28 de janeiro de 2012

"SILÊNCIO SILABADO"


Acaba de ser publicado o último número da revista "Praca Velha, Revista Cultural da Guarda", que integra uma excelente Recensão Crítica do Daniel Rocha sobre o meu livro "A Divina Pestilência" que nos misteriosos contornos dos deuses ou do destino obteve em 2010 o "Prémio Literário Manuel António Pina" atribuído pela Câmara Municipal da Guarda em parceria com a "Assírio & Alvim" que em 2011 viria a publicar a obra. Segue-se em baixo alguns trechos da recensão e aqui dois links, um do blog do José Mário Silva "Bibliotecário de Babel", onde se podem ler alguns trechos do livro e, o link do blog do Daniel Rocha onde se poderá  ler na íntegra a recensão. 





Se atentarmos na real necessidade de efectuar uma recensão crítica a uma obra que foi objecto de avaliação e de ponderação por um júri especializado na análise poética, facilmente chegamos à conclusão de que pode ser uma perda de tempo a atenta leitura e a posterior reflexão sobre essa obra vencedora de um qualquer prémio literário. No entanto, teremos de aqui concordar com sábias ideias avançadas por Edgar Allan Poe, um dos incontornáveis e polémicos nomes da literatura mundial, no seu artigo “Carta a B –“. Diz-nos ele:
(…)
Após esta reflexão inicial, o autor apresenta a epígrafe prefacial da obra que é constituída por dois haikai do imenso poeta japonês Matsuo Bashô (1644-1694). Estes haikai, que apelam à concisão e à precisão doutrinárias, apontam um sentido de escuridão no poema, demonstrando que o que poderá sobrevir no resto da obra é a constatação de uma esperança que poderá não existir. Já no haikai de Bashô que fecha o livro, apela-se ao silêncio que deixe a natureza fluir e realizar-se plenamente, sendo esta leitura compatível com as necessárias condições que devem ser reunidas para a existência de uma fruição poética completa. Convém referir que este tipo de poema, que ao nível da versificação aponta para uma espécie de terceto irregular, não tem quase expressão em Portugal (Albano Martins, David Rodrigues…?), mas no Brasil é cultivado desde o início do século XX (1919), por influência do poeta simbolista Afrânio Peixoto.
(…)
No entanto, poderemos ainda acreditar que o autor pretendeu com a utilização do terceto seguir a estrofe utilizada na obra de Dante. Todas hipóteses atrás citadas são plausíveis e pretendem a subjectividade que preenche a escrita do poema, cabendo-nos a nós, que o lemos, escolher a tentativa de interpretação que mais nos agradar. Neste caso, e tentando concluir a ideia iniciada com a reflexão sobre o haikai, convém ter em atenção que João Rasteiro consegue reunir com um agradável equilíbrio culturas distantes física e culturalmente: a ocidental, através de Dante, e a oriental, através de Bashô, ficando a dúvida sobre qual é a cultura que pretende salientar ao invés da outra. Na nossa opinião, nenhuma delas é submetida à outra, antes funcionando estética e representativamente ambas de forma eficaz.
(…)
A obra vencedora da 1.ª edição do Prémio Manuel António Pina é de difícil caracterização ou inserção numa qualquer corrente literária que nos tenha precedido ou que exista actualmente.
Poderemos ser tentados a chamar-lhe literatura contemporânea pela coexistência consciente de diferentes formas estéticas e de diferentes culturas. No entanto, se houvesse necessidade de a inserir numa corrente a criar ou que exista naturalmente sem necessidade de “encaixotamento”, diríamos que é uma obra que facilmente se inseriria num neossimbolismo de teor oriental, pois vive dos vários símbolos que são projectados em cada um dos tercetos e pretende uma relação do eu - leitor com o poema que propicie o equilíbrio.
Em conclusão, é uma obra que merece ser lida e relida, para que os múltiplos sentidos possam aproximar-se do entendimento. O júri deste prémio viu a potencialidade multissignificativa desta obra e a complexa teia em que ela foi urdida, dando ao poeta João Rasteiro um prémio merecido pelo intenso labor que lhe dedicou e que decidiu partilhar connosco.

sábado, 21 de janeiro de 2012

ROTAS


RUI COSTA: 1972/2012

Rui Costa era um dos nomes mais interessantes da nova poesia portuguesa.

Tinha vencido em 2005 o prémio de poesia Daniel Faria, com o seu livro "A Nuvem Prateada das Pessoas Graves", editado então pelas Quasi Edições.

Dois anos depois recebeu o prémio Albufeira de Literatura pelo romance "A Resistência dos Materiais".

Também em 2007, traduziu o livro de poesia "Só Mais Uma Vez", do poeta espanhol Uberto Stabile, para a coleção Palavra Ibérica, e em 2008 traduziu "Quarto Com Ilhas", do poeta espanhol Manuel Moya, para a mesma coleção, na qual publicou, em 2009, "O Pequeno-Almoço de Carla Bruni".

No mesmo ano, lançou ainda "As Limitações do Amor São Infinitas", pela editora Sombra do Amor.

Em 2008 co-organizou a Primeira Antologia de Microficção Portuguesa (Exodus).

Ainda no espaço algo complexo e hipócrita da Literatura Portuguesa, " terá cometido a façanha" de apresentar uma lista alternativa à direcção do Pen Clube Português em Janeiro de 2009, ao lado dos poetas Rui Lage e Rui Cóias.

Numa entrevista recente, Rui Costa defendeu o poder de resistência do livro face ao crescente primado da tecnologia e da mensagem instantânea.

O livro sólido, com peso de papel manchado de tinta, continuará a ter sentido enquanto usarmos as mãos que ainda temos”, afirmou.

Aqui ficam dois poemas de Rui Costa.

Poema inútil com montanha

Vejo a montanha à minha frente pousada
Sobre a água sempre verde, e penso na inutilidade
De tudo o que ela é, e na inutilidade de estar pensando nisto,
Quando um pensamento inútil me sugere
Que a montanha pode ser
Um pormenor pensado por ela
Na paisagem do meu próprio pensamento, para
Com isto me levar a pensar sobre pensamentos,
E não sobre montanhas, ficando ela, como antes,
Pousada na água sempre verde, sem ser
Pensada por ninguém.

O pão

Há pessoas que amam
Com os dedos todos sobre a mesa.
Aquecem o pão com o suor do rosto
E quando as perdemos estão sempre
Ao nosso lado.
Por enquanto não nos tocam:
A lua encontra o pão caiado que comemos
Enquanto o riso das promessas destila
Na solidão da erva.
Estas pessoas são o chão
Onde erguemos o sol que nos falhou os dedos
E pôs um fruto negro no lugar do coração.
Estas pessoas são o chão
Que não precisa de voar.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

ROTAS OUTRAS

[Letra para fado de Coimbra. Projecto do qual ainda não poderei falar]



BALADA DA SAUDADE

Senhora cidade minha
Minha cidade amor ausente
Minha cidade amor ausente

Saudade corpo sofrido
Desfolha o corpo cria semente
Desfolha o corpo cria semente

Guitarra coração fechado
Chora o coração vive somente
Chora o coração vive somente

Coimbra mulher vindoira
Sempre mulher sonho presente
Sempre mulher sonho presente.
                                      João Rasteiro