O volume, que reúne uma parte de reescrita da sua obra anterior e alguns inéditos, possui 207 páginas de poesia e uma extraordinária capa ilustrada por Ilda David, em tons de azul e amarelo.
De Herberto Helder, um poeta que deu a última entrevista em 1968, ("o poeta obscuro") e que recusou o Prémio Pessoa em 1994, vive em auto-reclusão e de si pouco se sabe, para além de que se chama Herberto Helder Luís Bernardes de Oliveira, tendo nascido no Funchal, a 23 de Novembro de 1930, e residindo actualmente em Cascais, com a mulher, Olga.
De 1954, data a publicação do seu primeiro poema, em Coimbra, na "Cabra", tendo posteriormente publicado também em Coimbra, na revista "Êxodo", talvez o seu primeiro ensaio literário.
Em 1958, publicou o seu primeiro livro "O amor em visita" e em 1961 e 1962, editou os livros "A Colher na Boca", "Poemacto" e "Lugar". Em 1973, publicou "Poesia Toda", reunindo a sua produção poética até à data, e fez uma tentativa falhada de publicar "Prosa Toda".
Depois de "mundear" por países como a Bélgica, França, Holanda, Angola ou Estados Unidos, volta a Portuga depois do 25 de Abril e depois de voltar a publicar, nos anos seguintes, mais algumas obras, entre as quais "Cobra" (1977), "O Corpo, o Luxo, a Obra" (1978) e "Photomaton & Vox" (1979), remeteu-se ao silêncio, a um silêncio avassalador, mas simultâneamente mítico.
E dele falou, numa carta enviada em 1977 à revista Abril, endereçada a Eduardo Prado Coelho: "O que é citável de um livro, de um autor? Decerto a sua morte pode ser citável. E, sobretudo, o seu silêncio".
Por isso, pediu aos amigos que não falassem dele num documentário que António José de Almeida pretendia realizar para a RTP2, em 2007.
O documentário, "Meu Deus, faz com que eu seja sempre um poeta obscuro", acabou por ser feito, mas apenas adensou o mistério em torno da figura do poeta, já que 17 das 29 pessoas contactadas pela produção se recusaram a dar o seu testemunho.
Da sua poesia, escreveu algo deslumbrado, o crítico literário Jorge Henrique Bastos, no livro " O corpo O lucho A obra" e responsável pela primeira edição brasileira da poesia de Herberto Helder publicada no Brasil, em 2000, que o poeta "impulsiona a viva encantação das palavras [e que] o abalo que a sua poesia provoca é um dos mais profundos que a literatura de língua portuguesa já sofreu".
Mistério, que por vezes é quebrado da forma mais surpreendente, quando sem ninguém esperar, escreve, essencialmente respondendo, a cartas de amigos, mas, também de desconhecidos, aqueles absolutos e eternos admiradores da sua poesia, e do qual este escriva é testemunha de tal facto na primeira pessoa.
Sobre o novo livro de Herberto Helder, disse o poeta Gastão Cruz à Lusa: "Não sei o que espero, somente que se situe, como decerto acontecerá, no nível da sua restante obra poética".
(...)
os cotovelos. batem folhas da luz
um pouco abaixo do silêncio. Quero saber
o nome de quem morre: o vestido de ar
ardendo, os pés e movimento no meio
do meu coração. O nome: madeira que arqueja, seca desde o fundo
do seu tempo vegetal coarctado.
E, ao abrir-se a toalha viva, o
nome: a beleza a voltar-se para trás, com seus
pulmões de algodão queimando.
Uma serpente de ouro abraça os quadris
negros e molhados. E a água que se debruça
olha a loucura com seu nome: indecifrável cego.
Resistência - "Chamaram-me Cigano"
4 comentários:
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bebamos o seu sangue
.em silêncio.
abraço
Sem qualquer dúvida um poeta extraordinário. E não sabia esses factos apontados no blogue, relativos a H.H. e Coimbra.Também gosto de R. Rosa, Eugénio e Jorge Sena.
Raramente por aqui passo, mas hoje valeu a pena.
porfirio, sejas bem aparecido. Quanto ao novo livro do Herberto, é um dos acontecimentos dos últimos anos, ou não estejamos a falar de um livro com 70 páginas inéditas, de alguém que já imaginamos no nosso inconsciente para lá do horizonte, naquele lugar indescritível, aquele lugar só para os imortais - até porque o seu longo e duradoiro silêncio nos remete para tal julgamento. MAS, como diz a Alexandra Lucas Coelho, no "ípsilon" de hoje: "há décadas que vem mantendo um intransigente silêncio, recusando prémios, entrevistas. Mas será que se cala? A obra não. Há vários criadores sob o impacto de Herberto. Herberto é uma poesia, mas também é uma vida."
Para mim é só o grande poeta vivo da literatura portuguesa ( um dos grandes do século XX em Portugal. E que para além da sua influência e deslumbramento (e também a grande perturbação)que sempre me causou com a sua poesia, me proporcionou uma das maiores surpresas que já tive, ao, como já te referi, ter-me escrito em 16.02.2006 - é sem dúvida para mim um marco inolvidável. Por isso, o livro "A faca Não Corta o Fogo", este fim de semana, sem dúvida, terá que sair da fnac para a minha secretária!!!
Um grande abraço,
joão
João, este silêncio "avassalador" de Herberto Helder emociona-me. Sinto-o como um espaço sagrado que emana luz. E tu estás sintonizado com essa luz de uma forma que também me emociona. Como disse Graça Capinha no prefácio ao teu belo livro "No Centro do arco",
"(...) É no silêncio que o Poeta mergulha como amante dele, extraindo alimento (...)".
Creio que o livro "A faca Não Corta o Fogo" já está na tua secretária. Aguardo, ansiosamente, neste espaço, um comentário teu a esta obra. Obrigada, desde já.
Um abraço
Maria João Oliveira
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