(POESIA,LITERATURA e a CULTURA em geral)»»»»»»»»»»»»»»»»
"Só existe o tempo único.
Só existe o Deus único.
Só existe a promessa única,
e da sua chama
e das margens da página todos se incendeiam.
Só existe a página única,
o resto fica,
em cinzas. Só existem
o continente único, o mar único –
entrando pelas fendas, batendo, rebentando
correndo de lado a lado".
__________ Robert Duncan
Respiro e escrevo silêncio no acto de escrever e silêncio até à distância extrema e na língua o silêncio ferve a grande terra da garganta branca lâmina e dedos quase míticos a líquida frescura dos golfos onde se renovam os silêncios sob a cúpula acolhedora do sangue o excesso do corpo dos mortos o silêncio que se deixa respirar. João Rasteiro .................................Buena Vista Social Club
José Afonso: Aveiro, 2/08/1929 — Setúbal, 23/02/1987 Que amor não me engana . Que amor não me engana Com a sua brandura Se de antiga chama Mal vive a amargura . Duma mancha negra Duma pedra fria Que amor não se entrega Na noite vazia . E as vozes embarcam Num silêncio aflito Quanto mais se apartam Mais se ouve o seu grito . Muito à flor das águas Noite marinheira Vem devagarinho Para a minha beira . Em novas coutadas Junto de uma hera Nascem flores vermelhas Pela Primavera . Assim tu souberas Irmã cotovia Dizer-me se esperas O nascer do dia José Afonso
António Ramos Rosa é candidato à 18º edição do Prémio Rainha Sofia de Poesia Ibero-americana, um dos galardões literários de maior prestígio no espaço hispânico. Já no ano passado, a SPA apresentara a candidatura de A. Ramos Rosa ao prémio, (facto inédito, a candidatuta dois anos seguidos do mesmo poeta) que tem a dotação pecuniária de 42100 euros. Prémio que apenas foi ganho uma vez por um(a) português(a), Sophia de Mello Breyner Andresen na edição de 2003. Sendo um dos mais prestigiados prémios literários, pretende distinguir o conjunto da obra poética de um autor vivo que, pelo seu valor e impacto literário, constitua uma contribuição extremamente relevante para o património literário e cultural, partilhado por toda a comunidade ibero-americana. Poetas como Antonio Gamoneda, Mario Benedetti ou João Cabral de Melo Neto (para além de Sofia) já conquistaram o prémio.
Estou vivo e escrevo sol
Eu escrevo versos ao meio-dia e a morte ao sol é uma cabeleira que passa em fios frescos sobre a minha cara de vivo Estou vivo e escrevo sol Se as minhas lágrimas e os meus dentes cantam no vazio fresco é porque aboli todas as mentiras e não sou mais que este momento puro a coincidência perfeita no acto de escrever e sol A vertigem única da verdade em riste a nulidade de todas as próximas paragens navego para o cimo tombo na claridade simples e os objectos atiram suas faces e na minha língua o sol trepida Melhor que beber vinho é mais claro ser no olhar o próprio olhar a maravilha é este espaço aberto a rua um grito a grande toalha do silêncio verde. António Ramos Rosa ............................................The Animals-House of the Rising Sun
..........................................Alfredo Luz O corpo profuso flutua incendiado como os tendões duros da terra, eu sigo o eco da maturação perfeita, um círculo fechado no halo dos enigmas que ignora a extensão da sua teia púrpura
(...)
Há bocas cheias de secretos signos que a água não escondeu dentro do fogo mães rasgando um lento solo sagrado
(...)
Olho os favos de mel da idade inicial o lugar em que se simula a ressurreição e as veias são um rastro de estrela.
Raúl Perez, aqui em amena conversa, comigo e com o pintor Seixas Peixoto, durante a inauguração da exposição "A Voz dos Espelhos", Amadora/08, nasceu em Lovelhe-Minho em 1944. Realizou a sua 1º exposição individual em 1972 a convite de Cruzeiro Seixas. Depois de em 1973 integrar o Movimento Phases, expôs em vários locais, quer em Portugal, quer no estrangeiro, tendo ao longo dos anos integrado algumas das mais importantes exposições do surrealismo internacional, mesmo recusando-se a integrar explicitamente um movimento artístico, partido, clube ou religião. A sua pintura, ditada essencialmente pelo automatismo, cria uma imagética organicista e contagiante de seres híbridos, de contornos moles e ondulantes, em áridas arquitecturas e crepusculares ambientes metafísicos (Gonçalves & Cuadrado, 2004). É sem dúvida hoje, um dos mais importantes pintores portugueses contemporâneos.
O Museu Colecção Berardo apresenta a maior exposição de sempre do pintor Raúl Perez-Cerca de 90 desenhos e pinturas criadas entre 1960 e 2008 por Raúl Perez vão ser apresentados segunda-feira no Museu Colecção Berardo, naquela que é a maior exposição de sempre dedicada ao universo plástico deste artista português."Raúl Perez - Desenho e Pintura" será apresentada em colaboração com a Fundação Cupertino de Miranda, com sede em Famalicão, onde, em 2006, o pintor de 64 anos apresentou uma outra exposição com cerca de setenta obras. Foi a partir dessa exposição que decidiu fazer uma mais alargada, com uma selecção de obras "mais apurada", totalmente dedicada a uma fase iniciada a partir dos anos 1960, explicou Raúl Perez em entrevista à Lusa a poucos dias da inauguração. (In, Público).
Em sua homenagem, um poema de Mário Cesariny, um pintor e poeta que sempre admirou.
Crateras de pedra acesa ...........................A Jesús Hilário Tundidor
Deves ser a derradeira cidade dos primitivos animais doirados que aspergiam a pedra do interior dos pulmões as bárbaras vísceras do Minotauro na polpa crua que se adoça em minha fronte, . como o seixo que se desabrocha puro do âmago corrompido da terra trepando para beber a sede irada do Tormes e em seu flanco esperar pelo sol que fulge o fogo. . Procuras a deflagração ao centro, um modo de te amar as crias dentro do tempo aonde se ampara o precipício imediato da sílaba. .............................................João Rasteiro . JOSÉ CARRERAS -GLORIA (MISA CRIOLLA)
Foi editada recentemente a antologia "Os dias do Amor - Um poema para cada dia do ano", 365 poemas de amor escritos por 365 poetas de todos os tempos e de todos os lugares. A recolha, selecção e organização foi efectuada pela Inês Ramos e inclui prefácio de Henrique Manuel Bento Fialho. A obra conta com nomes variados, portugueses e estrangeiros, poetas com obra e nome já "feito" e também com poetas menos reconhecidos, ou menos visíveis, mas que no seu conjunto contribuem para um belo livro de poesia. A antologia conta com nomes como, António Ramos Rosa (Portugal), Affonso Romano de Sant'Anna (Brasil), Luís de Camões (Portugal), Almeida Garrett (Portugal), Al-Mu’tamid (Alandalus), Bocage (Portugal), D. Dinis (Portugal), Daniel Faria (Portugal), Dante Alighieri (Florença), Emily Dickinson (EUA), Fiama Hasse Pais Brandão (Portugal), Nuno Júdice (Portugal), Gabriela Rocha Martins (Portugal), etc. E é da Gabriela R. Martins o poema que se segue e incluido na antologia, até porque sem falso pudor, me sinto bastante lisonjeado por o poema me ser dedicado.
-O Caçador.Cativo ............................ao João Rasteiro
.
haviam.se em vão procurado nas cidades
.
percorrera continentes
quando desistira
encontrara.se solto no ritmo lento
de uma valsa
dançada em contra.mão
.
desintegrado
.
sentira as ondulações das cearas
que cearara em dança lenta
regressara estranho às recordações de antanho
antanho era a linguagem de seus avós
.
havia crescido junto à terra gretada
pela fome das manhãs abertas
desde cedo havia sentido a boca
apagada de desejo de terra pão
fustigada pelo vento
.
havia pulado a cerca
construída sobre os dias
como as copas das árvores que
costumava ouvir à noite entregue
aos seus passos de caçador furtivo
fora numa dessas deambulações que a encontrara
solta
aproximou.se
ela a medo levantou as asas
no voo ferido
.
soltou os cães
ficou suspenso à dança do animal
em voo
primeiro raso
depois mais alto
arribando em direcção ao mundo
em tons de mel
engrossou o batimento das asas
ao som da pressa
do homem / caçador / cativo
daquele voar
enquanto filados
os cães esperavam a voz de comando
.
ele muito aquém da aventura
seguia.lhe o volteio
o silêncio da terra era o elo que os unia
.
ele o caçador cativo
ela solta à migração
.
o desejo deixava.os sob um manto de horas
semeadas a esmo
que estranho aquele olhar que
se projectava na mira do caçador
tornando.a vulnerável ao cúmplice
jogo do agarra e foge
ele o enfabulador
regressava caçador
ela de asas fechadas
pronta a deixar.se prender
olhou.o
ele viu.se
projectado no olhar em flash . uma ave / dona.
Gabriela Rocha Martins .............................."Dancemos no Mundo" -Sérgio Godinho
"Hilda Hilst, uma das maiores escritoras brasileiras e falo escritor, do porte de uma Clarice Lispector sem desmerecer Guimarães Rosa , foi uma mulher muito injustiçada. Dona de um estilo único, ela nunca teve no grande público a repercussão que merecia (...)Morreu na solidão e morreu na incompreensão.". - Ignácio de Loyola Brandão da morte. odes mínimas . Teu nome é Nada. Um sonhar o Universo No pensamento do homem: Diante do eterno, nada. . Morte , teu nome. Um quase chegar perto. Um pouco mais (me dizem) E terias o Todo no teu gesto. Um pouco mais, tu O terias visto. . Teu nome é Nada. Haste, pata. Sem ponta, sem ronda. Um pensar duas palavras diante da Graça: Terias tido. . Árias Pequenas. Para Bandolim . Antes que o mundo acabe, Túlio, Deita-te e prova Esse milagre do gosto Que se fez na minha boca Enquanto o mundo grita Belicoso. E ao meu lado Te fazes árabe, me faço israelita E nos cobrimos de beijos E de flores . Antes que o mundo se acabe Antes que acabe em nós Nosso desejo. . Via Vazia VIII . Descansa. O Homem já se fez O escuro cego raivoso animal Que pretendias.
Hilda Hilst - A sublime SenhoraH. - Música de Mallu Magalhães
Respondendo ao excelente repto da Gabriela Rocha Martins (Blogue: .canto.chão.), transcrevo a 6º linha, da página 161 da obra "Os Passos em Volta", de Herberto Helder, 3º Edição, 1970, a partir da qual "saiu" o poema que se segue - "Pequena oração para uma geografia familiar". Eu também irei lançar os meus reptos.
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........"Era uma velha mãe em fundo de jarrão verde com (...)"
Pequena oração para uma geografia familiar
Esperava cobrir a terra novamente de júbilo ser oferenda madura como uma tâmara imitando a densa voracidade de uma velha mãe que intransigente é o arco de si própria mas tu estarás pomar em fundo de jarrão verde dobrado sobre a dilatação das casas acesas anteriores ao fogo louco da sílaba. . E sei que há um silêncio de primaveras negras e digo que todo o amor é uma abóbada de pequenos vulcões que adormecem junto ao barro morrendo entre lírios e chuva regeneradora e vejo o odor maternal fundir barro e cor corpos metidos em conchas verdes sob o coração. . Mas tu, ó relâmpago que esmagas a prumo fundo a luz arrancada das ciladas nocturnas, ó cometa obscuro atravessado por dentro do milagre? . Do lugar circunscrito às talhas espero a obra cega no segredo da traqueia das mulheres que criam nas cisternas mais fundas sob o verde puro da laranjeira uma ave-maria como uma desmesurada boca viva uma velha geografia - a força magnética da criação dobrada em si mesma por doces lágrimas envelhecidas. João Rasteiro ..............................Pink Floyd - Mother