sábado, 26 de janeiro de 2008

A educação pela pedra I

João Cabral de Melo Neto é um dos maiores nomes da história da literatura brasileira. João Cabral, apresenta-nos uma poesia que é um marco dentro da poesia em língua portuguesa. A sua obra desencadeou uma revolução formal das mais importantes na história da poesia brasileira e até da poesia em língua portuguesa. Ela representa a maturidade das conquistas estéticas mais radicais do século XX. Em 1980, o poeta afirmava: "A poesia funciona como um pêndulo. Numa hora oscilou para o rigor e eu coloco aí o concretismo e a práxis. Agora o relógio vai noutra direcção (...). Parece que as pessoas criam em dois minutos, de um só jacto, e que não têm paciência de ler". João Cabral, opondo-se ao principal curso da poesia brasileira, sempre sentimental, retórica e ornamental, constrói uma poesia "não-lírica", não confessional, presa à realidade que o cerca e essencialmente dirigida ao intelecto.(...)Para João Cabral, o acto de escrever consistiu sempre, num trabalho imenso de depuração, as palavras sempre saboreadas e seleccionadas pelo seu "sabor" e "peso", não podendo "boiar" sem norma e/ou reflexão(...) - CORSINO FORTES e JOÃO CABRAL de MELO NETO ou OS ARTÍFICES da PALAVRA, João Rasteiro - http://www.triplov.com/
Tecendo a manhã
1.
Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito que um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.
2.
E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.
A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.
QUESTÃO DE PONTUAÇÃO
1.
Todo mundo aceita que ao homem
cabe pontuar a própria vida:
que viva em ponto de exclamação
(dizem: tem alma dionisíaca);
2.
viva em ponto de interrogação
(foi filosofia, ora é poesia);
viva equilibrando-se entre vírgulas
e sem pontuação (na política):
3.
o homem só não aceita do homem
que use a só pontuação fatal:
que use, na frase que ele vive
o inevitável ponto final.
João Cabral de Melo Neto
http://triplov.com/poesia/joao_rasteiro/Corsino-Fortes/Joao-Cabral-busca.htm
http://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_Cabral_de_Melo_Neto
http://www.casadobruxo.com.br/poesia/j/joao.htm

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