quinta-feira, 8 de maio de 2008

LIVROS

LIVROS: uma antologia e um primeiro livro. A poesia nas suas formas nuas. A força da palavra e da poesia em suas múltiplas veias.
A editora COSMORAMA acaba de editar o livro escrito em osso do poeta brasileiro Claudio Daniel. Este livro é uma pequena antologia de um dos nomes mais interessantes e promissores da nova poesia brasileira. Como refere Ernesto M de Melo e Castro no prefácio do livro: "(...)Leia-se, portanto esta antologia de Claudio Daniel como um marco desta re-nova estética e da intervenção da poesia, tão urgente como necessária, nas nossas vidas trucidadas pelos universos da sobre-informação pateticamente vulgar e tragicamente redundante". Claudio Daniel que é também tradutor e ensaísta, publicou o seu primeiro livro - SUTRA - em 1992 e o último - PERSPECTIVA - em 2005. É o editor da revista electrónica de poesia e debates ZUNÁI.
"Pequeno Sermão aos Peixes"
a
água
é luz, a água
é sêmen, prata, mercúrio
espelho esférico de imagens trêmulas
que brotam, flutuam e cessam
oh esplêndidas carpas!
entre rajados cardumes, coroas de branca espuma
e radiantes medusas
- lâminas prismáticas de uma vasta geografia -
vi o galho curvo da cerejeira
uma nuvem, meu rosto
e a rã
Claudio Daniel
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Se em cima falei de uma antologia, o que pressupõem já obra feita, agora falo do primeiro livro de uma poeta. A poeta Alice M. Campos lançará no próximo dia 10 pelas 16h no Auditório da Casa-Museu Abel Salazar em S. Mamede de Infesta o seu livro de estreia. Esta obra, “o ciclo menstrual da noite, é um livro, independentemente da minha amizade pela Alice Campos, que já possui um trabalho de linguagem extremamente forte. É um livro onde a metáfora por vezes fere de forma abundante e onde a condição de mulher é abordada com tal pujança, que apenas assistimos ao remexer da sílaba nas entranhas de uma forma tão viva e sem amarras, de uma forma totalmente exposta como a poesia merece e exige.
Como refere no prefácio, Joaquim Fernando Fonseca: "No tempo em que as palavras estavam carregadas de magia, et deus erat verbum, talvez até tenha havido um tempo em que a palavra noite pareceu escura e em que a palavra mulher sabia a leite e cheirava a sangue e a sexo, e à hora do pombo sucedia a hora do corvo saeculis saeculorum enquanto as palavras não se tornaram moeda do comércio da vida de todos os dias e quando língua e realidade talvez até se confundissem numa relação natural.Nesse tempo, em que as palavras estavam carregadas de magia e poder e em que a felicidade não tinha ainda algo de trivial, e em que os outros não eram ainda casas de e onde se ia sofrer, tornou-se evidente que o que era próprio do homem, mais que o silêncio, era a palavra".
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sabes, mãe. os camelos atravessam o deserto desde o meu antebraço
sabes, mãe. os camelos atravessam o deserto desde o meu antebraço.
é difícil suportar a lonjura a que os meus pés estão da sua vontade.
a catarina escreveu um livro feito desta matéria invisível que nunca li.
mas nenhuma ave levanta o seu nome como ela. só sei que a voz é um
objecto meramente fálico. um homem que não diz um beijo, saberá beijar?
e a palavra dita na carne exposta, é já um lampejo de serenidade?
não sei, mãe.
tenho, aliás, fotografias que comprovam a incerteza destes últimos dias.
o tempo faz paragens a meio das dunas, quando a curva rói o grito.
há barulhos entrelinhas que não entre dentes.
tenho medo de cair no vácuo do desentendimento e ainda mais de não cair.
será o amor uma aventura dromedária?
um homem que não tem cara, será uma duna árida?
se eu fosse de areia, teria sido útil à coragem.
como sou de vidro, deixo que me partam.
eu era capaz de amar um homem invisível.
é por isso, mãe.
tenho de lhe escrever. para não o odiar.
alice macedo campos

4 comentários:

Anónimo disse...

:) obrigada, joão. gostei muito de encontrar aqui um poema meu e agradeço a tua divulgação do evento de apresentação do meu livro. um grande beijinho *

Anónimo disse...

Parabéns à Alice, já não era sem tempo o seu primeiro livro. escreve muito bem.
Quanto ao poeta brasileiro, será para descobrir a sua poesia a partir de hoje.
Carlos Perez

Gabriela Rocha Martins disse...

como te subscrevo quando assim escreves e nos "dás" um pouco mais da poeta "feiticeira de Oz" ,como gosto de lhe chamar ,quando ,comovida ,a leio


.
um beijo ,João

Gabriela Rocha Martins disse...

Cláudio Daniel já o havia encontrado ,lido ,sabido e tido em Zunái